Sofri uma violência. Posso expor meu agressor na internet?

Você provavelmente já se deparou com o relato de uma mulher em alguma rede social expondo alguma violência machista da qual foi vítima. Depois de séculos de silenciamento, as redes sociais se tornaram um canal onde as mulheres finalmente podem ter voz. Onde seus relatos são ouvidos e ganham credibilidade.

Embora seja uma ferramenta muito eficaz para garantir visibilidade às violências sofridas pelas mulheres, os “textões” também têm se tornado uma verdadeira armadilha para suas expositoras.

Isso porque, muitas vezes, no calor do momento, a mulher, além de relatar uma situação que vivenciou, também expõe seu agressor, com foto, nome, endereço, local de trabalho ou estudo e demais elementos identificadores. E como é natural das redes sociais, esses relatos ganham curtidas, comentários e compartilhamentos virais.

Apesar de a liberdade de expressão ser um direito constitucionalmente protegido, da mesma forma é o direito à imagem, honra e vida privada.

O resultado disso? A vítima pode acabar se tornando ré em um processo por danos morais na esfera cível, ou por injúria, calúnia ou difamação na esfera criminal, movido por seu próprio agressor. No fim, ela pode acabar sofrendo uma dupla violência.

Levando em consideração que o Judiciário nem sempre demonstra muita sensibilidade para violências de gênero, é possível que os resultados não sejam positivos para as mulheres que buscam ali um mínimo de reconhecimento.

Então eu não posso fazer um relato da violência que sofri?

Pode! Denunciar violências sofridas é muito importante. É uma forma de empoderamento. O contato com esse tipo de relato encoraja outras mulheres a também denunciar, buscar ajuda e sair de uma situação de abuso. Além disso, é uma forma de mostrar a toda a sociedade que nós não iremos mais tolerar violências machistas.

Não queremos que mulheres sejam novamente silenciadas. Muito menos queremos que sejam penalizadas por exporem seus relatos. Por isso, é importante que as mulheres que desejam publicizar suas histórias observem alguns cuidados.

O que pode conter no meu relato?

O relato pode conter:

  • Exposição da sua história, com a narrativa dos episódios de violência vividos (sejam de natureza física, psicológica, sexual, moral, patrimonial, virtual, e outras) e como você se sentiu a respeito;
  • Descrições superficiais da pessoa ou local onde a violência ocorreu, desde que não identifiquem de maneira clara o agressor ou estabelecimento. Por exemplo, você pode dizer que ele era um homem forte, alto, de determinada classe social ou profissão, tomando cuidado para que esses dados não especifiquem de quem exatamente você está falando;
  • Provas, como fotos das agressões, troca de mensagens, boletim de ocorrência – DESDE que oculte dados do agressor (como nome, foto, número de telefone, endereço, etc);
  • Canais de denúncia e incentivos para que outras vítimas também denunciem

O que NÃO deve conter no meu relato?

O problema do “textão” surge quando a pessoa a ser exposta pode ser identificada. Pois, apesar de ser considerado um agressor, a lei confere a todos o direito à imagem, reputação, honra e privacidade.

A depender de como o relato é elaborado, a pessoa que foi exposta pode processar a mulher por danos morais e também pelos crimes de injúria (se houve ofensa), calúnia (se foi imputada a prática de um crime falso) ou difamação (a exposição em si já gera esse direito).


Então, o relato deve evitar:

  • Expor nome, endereço residencial ou profissional, número de identidade, telefone e demais dados da pessoa;
  • Onde o agressor estuda ou trabalha. Se esses dados forem essenciais para o relato, tome cuidado para não expor de forma que identifique facilmente. Por exemplo, você pode dizer que a pessoa é médica, mas evite dizer o nome do hospital;
  • Foto do indivíduo ou de sua família, seja do rosto, ou de elementos que caracterizem a pessoa (ex: uma tatuagem);
  • Ofensas, xingamentos e imputação de crimes falsos. Se o seu relato inclui a prática de um crime (ex: estupro, ou lesão corporal), não vá além daquilo que realmente aconteceu. Nesses casos, é recomendado ter pelo menos algumas provas do seu relato para se resguardar judicialmente.
  • Incitação de ódio ou represálias contra a pessoa exposta. Evite convidar pessoas a xingarem o agressor em sua página pessoal.

Pessoa jurídica

As mesmas considerações acima valem para quando o relato expõe uma empresa acusada de ser conivente com uma violência. Isso porque a empresa também tem direito à imagem, e caso esta se sinta prejudicada, poderá processar a mulher por danos morais.

Então, neste caso, deve-se evitar falar o nome ou endereço da empresa, ou demais elementos caracterizadores. Por exemplo, se a violência foi sofrida dentro de uma balada, pode falar que se tratava de casa noturna, mas evite expor qual foi.

Lembre-se: busque sempre os caminhos legais!

A decisão de como realizar esse relato, claro, sempre deve ser da vítima. Caso a mulher entenda que expor esses dados é essencial, é importante que esteja consciente dos riscos e preparada para uma possível represália futura.

Apesar de os relatos na internet parecerem uma saída mais rápida e eficaz para a responsabilização do agressor, não se esqueça de procurar também os caminhos legais.

Fazer um boletim de ocorrência, pedir a abertura de um inquérito policial, denunciar nos órgãos de controle e fiscalização (caso a agressão esteja relacionada com exercício de profissão ou seja pessoa jurídica) e nos canais de ajuda, como 180, são sempre soluções mais recomendadas.

Além desses órgãos poderem, efetivamente, tomar medidas para remediar a violência, denunciar nos meios legais também dificulta que a mulher seja condenada caso processada por seu agressor.

E lembre-se: na dúvida, sempre consulte uma advogada.

 

Por Ana Paula Braga e Marina Ruzzi, advogadas especialistas em direito das mulheres e sócias da Braga & Ruzzi Sociedade de Advogadas.

13 comentários em “Sofri uma violência. Posso expor meu agressor na internet?”

  1. Aconteceu exatamente isso comigo.. e agora ainda tenho que pagar 5mil pro meu ex, depois de tudo que ele me fez. Acho muito injusto que A GENTE que tenha que tomar cuidado com os caras, mas infelizmente é assim. nao me arrependo de ter exposto ele, mas se pudesse voltar atras teria tomado esses cuidados

  2. Muito didático o texto. Eu tenho uma amiga que fez um post e esta no ar ainda. Ela deve editar ou retirar? Ela ainda pode ser processada?

    1. Oi Raquel, tudo bem?
      É mais seguro se ela puder editar para remover esses dados que identifiquem o agressor. A depender de quando foi feito esse post e de como ele foi feito, ela poderá ser processada (não significa que ela vai, mas é um risco). O prazo que uma pessoa tem para processar no criminal é de 6 meses, e na esfera cível é de 3 anos. Na dúvida, é melhor ela consultar uma advogada. Abraços

  3. Olá bom dia meu cunhado fez uma acordo de boca com a ex mulher, e ficou pagando o valor do acordo, uns 2 anos mais ou menos, e por esse dias veio uma oficial de justiça em casa com uma ordem de prisão e dizendo que ele estava devendo 7 mil, aí ele procurou um advogado que começou um processo só agora toda vez que meu cunhado vai falar com o advogado o valor muda era 7 mil depois foi pra 12 mil depois 15 mil agora já está dezoito mil e normal isso? e já tem 3 meses isso e o advogado não resolveu nada

    1. Oi Fabio. É normal que o valor da dívida vá aumentando sim, pois incidem juros, multa e as pensões que vencem no curso do processo. Abraços

  4. Boa noite.

    Tive um problema parecido. No caso, nao falava nome do agressor, fotos, nada que pudesse identifica-lo, apenas informei que ele continuava com as agressoes psicologicas e que nao me livraria 100% dele pois ele era pai do meu filho. O relato nao foi feito na minha rede social, mas sim no comentario em um perfil de uma moça que fez uma campanha pedindo para que outras pessoas contassem seu relato. Acontece que o agressor teve acesso ao meu comentario e me processou. O que fazer?

    1. Oi Raissa. Você vai precisar se defender nesse processo. Teríamos que analisar o caso e os documentos para poder te orientar melhor e avaliar suas chances de sucesso nessa ação. Abraços

  5. Olá, eu queria fazer um vídeo, já sabia que não iria falar sobre nomes e dados pessoais, mas queria relatar que sofri violência física e sexual, no entanto só tenho uma foto de meu braço cortado, porém foi a algum tempo atrás.
    Devo relatar?

    1. Oi Gabriela. Você pode relatar suas vivências e experiências sim. Ninguém pode te obrigar a silenciar sua narrativa. Só tome cuidado com a exposição de quem fez isso com você para evitar represálias 🙂

  6. Boa noite!
    A pessoa fez uma postagem de uma fofoca de mim, relacionado aos meus desentendimento com meu marido. E depois apagou dizendo que não era para mim, mas se a carapuça servisse. Eu disse que ela não tem direito alguma. Dr ficar ouvindo a minha irmã timidade comigo e meu marido. Porém faz quentão de ouvir tudo e sair contando as coisas para uma confidente que tudo contam uma pra outra. E depois ainda vem me cortar coisas que não incisto ter interesse. E por esse motivo já desconfiada e fazem tudo no calado. Numa saída para uma caminhada demorei e meu esposo se exaltou e saiu minha procura. Sabendo de tudo por só ficam de ouvido em pé, postou em seu status :
    Se você não gosta de
    Que façam com você , não façam com os outros. Fui perguntar o que significava esse
    Status . Veio nervosa dizendo que a carapuça serviu e que não era para mim, mas se eu entendi como se fosse eu era puta , piranha e que está traindo o irmão dela. Perguntei de você tem provas sobre isso , ficando exaltada dizendo que iria na na minha cara e eu simplesmente disse bem dá
    Quando veio segurei sua mãe e falei da falsidade e ela prontamente com a outra me deu um tapa no p
    Rosto e continuou me defamando dizendo que até meu filho eu deixo na área largardo. Área minha telada que deixo a vontade e sempre vejo brincadeiras. Meu filho nunca ficou doente criado brincando na área da varanda. Preciso saber que caminho tomar.

    1. Você pode ir na delegacia e registrar um boletim de ocorrência pela difamação (falar mal de você), injúria (te xingar) e pelo tapa (lesão corporal ou via de fatos). Abs

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